ENTREVISTA
Nuno Cordeiro
RFD Nº15
NUNO CORDEIRO
Fisioterapeuta
VICE-PRESIDENTE
ORDEM DOS FISIOTERAPEUTAS
O Regulamento do Ato do Fisioterapeuta foi recentemente publicado em Diário da República, cumprindo-se assim, o processo de criação de um dos instrumentos fulcrais para a regulação do exercício profissional do fisioterapeuta.
NUNO CORDEIRO (NC) – Antes demais uma correção, que não é mais que um preciosismo, mas que representa muito para consolidação do exercício profissional do fisioterapeuta, este documento representa um instrumento fulcral de autorregulação e não simplesmente de regulação, já que foi a primeira vez que os fisioterapeutas puderam ser eles próprios a poder designar os atos que lhe são próprios e que no fundo, representa a aplicação da ciência da fisioterapia, que lhe é própria.
RFD – Mas já antes tinham sido apresentados outros documentos que abordavam o conteúdo profissional do fisioterapeuta e uma definição do que representa
ser a Fisioterapia?
NC – Sim, mas sempre por entidades externas à própria profissão, embora ouvindo os representantes da profissão, é certo, mas nunca numa perspetiva de definição completa da aplicação da ciência da fisioterapia, no âmbito da sua plena capacidade, que pela sua especificidade só o fisioterapeuta entende, visando o reforço da relação fisioterapeuta-utente, na medida em que promove uma informação completa. Daqui a necessidade e a importância de uma autorregulação.
NC – Claramente que reforça também a relação dos fisioterapeutas com outros profissionais de saúde, na medida que no ecossistema das profissões de saúde se passa a perceber exatamente o que o fisioterapeuta nomeadamente as suas competências, autonomia e responsabilidade.
RFD – É ato do fisioterapeuta a aplicação da ciência da fisioterapia em todas as áreas que envolvem o sistema do movimento e a funcionalidade. O que representa esta junção movimento/funcionalidade?
NC – O fisioterapeuta é por excelência o profissional de saúde especialista no sistema de movimento. Pondo a pessoa no centro do algoritmo, compreende o sistema de movimento e a forma como o mesmo se relaciona com a funcionalidade. Aqui a funcionalidade refere-se como a integridade funcional e estrutural do indivíduo. Por outras palavras, a raiz da profissão integra os conhecimentos das ciências da saúde e das ciências do movimento, fundindo-as num corpo de saberes próprios, desenvolvidos, entretanto, enquanto área que se fundamenta na ciência da fisioterapia.
Naturalmente que o propósito final é a otimização do movimento per se com ajustamento à funcionalidade/incapacidade e/ou fatores contextuais que a envolvem, na promoção da participação do sujeito na plenitude do quotidiano.
Acresce que deverá ser visto necessariamente no sentido positivo. Olhe o desporto, tema central desta revista, é um excelente exemplo do que se pretende de otimização do movimento.
RFD – O regulamento caracteriza o processo de fisioterapia como a materialização do ato do fisioterapeuta. Compreende-se assim que todas as componentes do processo são os atos do Fisioterapeuta?
NC – Existe uma necessidade absoluta de deixar de olhar para o fisioterapeuta como um profissional de saúde que se apresenta com um conjunto de “técnicas”, como se tivesse uma caixa de ferramentas, e que o profissional que tenha uma caixa de ferramentas mais ampla, entenda-se como “sabendo mais técnicas”, seja melhor profissional ou mais preparado. Ser fisioterapeuta é ter uma profissão intelectual e não uma profissão de aplicação de técnicas.
Ora isso implica olhar para o processo de fisioterapia como a materialização do ato do fisioterapeuta, onde necessariamente todas as componentes do processo de fisioterapia terão sempre que estar e a intervenção, propriamente dita, é apenas uma etapa desse processo, que tem necessariamente sempre ser precedida do Exame/avaliação, diagnóstico, prognóstico e plano dessa mesma intervenção, e continuando o processo até à sua conclusão.
RFD – O fisioterapeuta atua nos quadros cinesiopatológico e patocinesiológico, na prevenção dos distúrbios relacionados com o movimento. Que especificidade têm estes quadros conceptuais para os fisioterapeutas?
NC – Têm toda a importância. É claro que o fisioterapeuta tem no seu conhecimento a fisiologia e daí também a fisiopatologia, conhece a anatomia e dai também a pato-anatomia, mas como já dissemos, o fisioterapeuta também tem no seu conhecimento o que tem como raiz a ciências do movimento. Torna-o por isso o único profissional de saúde capaz desta conjugação de conhecimentos, sendo, por essa via, a componente conceptual do movimento uma competência lógica do fisioterapeuta e com uma visão única de perceber a suas diferentes condições, patológicas e não só.