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ENTREVISTA

Luísa Amaral

RFD Nº11

Luísa Amaral

Fisioterapeuta

 

 

DOCENTE HÁ 18 ANOS DO
CURSO DE FISIOTERAPIA

Luísa Amaral, Docente há 18 anos do Curso de Fisioterapia na Escola Superior de Saúde Fernando Pessoa, reconhece que ainda existem diferenças na forma como o fisioterapeuta é visto noutros países mas sublinha o “caminho certo” que está a ser seguido e propondo o reforço da autonomia da profissão sugere a implementação de programas de estágio “em contexto de treino e de competição”.

“Ainda existe uma falta de reconhecimento e valorização em Portugal”

REVISTA DE FISIOTERAPIA DESPORTIVA – O exercício da Fisioterapia em Portugal é muito diferente do que era quando iniciou a carreira?

LUÍSA AMARAL (LA)Sim, correspondendo, deixe-me desde já dizer-lhe, ao que seria expectável e absolutamente desejável. Existe, independentemente de algumas insuficiências, um maior reconhecimento clínico, de natureza social e até do ponto de vista político.

RFD – Quais são as condições essenciais para um profissional se destacar?
LA… Gosto pela profissão, muita dedicação, responsabilidade e profissionalismo, o que deve coincidir com a atualização permanente dos conhecimentos teórico-práticos maioritariamente direcionados para a sua área profissional, não descurando todas as outras áreas que devem ser sempre levadas em linha de conta para a maximização da performance do atleta. No fundo, requisitos associados ao conhecimento básico da(s) modalidade(s) onde está inserido, até porque é extremamente importante “saber estar” numa equipa multidisciplinar.

RFD – Considera que é um ramo apelativo e correspondente às expectativas dos jovens licenciados?
LAPenso que sim, muitos dos alunos foram atletas e têm um interesse acrescido por este ramo da Fisioterapia. Contudo, na minha perspetiva, seria interessante implementar programas de estágio em contexto de treino e de competição, mesmo que esta vertente fosse meramente opcional. Desta forma, os recém-licenciados já teriam uma vivência mais real da intervenção de um fisioterapeuta no Desporto, despertando para a necessidade de efetuar certas formações extra licenciatura.

RFD – Se é verdade que a Fisioterapia evoluiu muito, que medidas substanciais contribuíram para isso?
LAA existência de uma associação ativa (Associação Portuguesa de Fisioterapeutas), a luta persistente dos fisioterapeutas pela criação da Ordem dos Fisioterapeutas, a constante procura por uma maior qualidade do exercício da profissão e do Ensino identificam fatores de enorme relevância. Juntaria, no quadro dessas medidas substanciais, a variedade de formações pós-graduadas nos diferentes ramos da Fisioterapia e a investigação acerca dos procedimentos terapêuticos. Tudo isto suscitou um notório desenvolvimento e continua a fazer com que a Fisioterapia evolua, proporcionando ao fisioterapeuta uma intervenção autónoma e de qualidade reconhecida.

RFD – E já agora, olhando para o futuro, se dependesse de si, que aspetos gostaria de ver salvaguardados?
LATalvez começasse pelo reforço da autonomia da profissão, em paralelo com a integração em mais unidades de saúde e/ou desportivas. Na minha opinião, esta integração facilitaria um maior reconhecimento da Fisioterapia nas equipas multidisciplinares. Por outro lado, a consolidação de especialidades, o estabelecimento de graus na carreira e o término da mesma ocorrer em tempo mais apropriado e de acordo com as exigências da profissão de certeza que proporcionaria melhores e mais estruturantes condições para encarar o futuro.

RFD – O que a levou a ser fisioterapeuta?
LADesde sempre, diria, a Educação Física foi a minha primeira opção, até por ter sido atleta de Ginástica, primeiro Ginástica Artística e depois Ginástica Rítmica. Mas, no período de candidatura à faculdade, candidatei-me ao Instituto Superior de Educação Física (ISEF) e à Escola Superior de Alcoitão (ESSA), pelo facto de a Reabilitação/Recuperação ser igualmente outra área de eleição. Entrei nos dois cursos e … optei pela Fisioterapia, logo com o objectivo de direcionar a minha prática profissional para a Fisioterapia no desporto. Felizmente, consegui, ao ponto de me sentir completamente realizada.

RFD – Com base na sua vasta experiência, existem ou não diferenças marcantes no que respeita à valorização e ao reconhecimento em Portugal face a outros países?
LASim. Ainda existe uma falta de reconhecimento e valorização em Portugal face à realidade de outros países, mas penso que estamos no caminho certo e gradualmente vamo-nos afirmando como profissão. A nível da prática, e como fisioterapeuta no Desporto, considero que as nossas competências são comparáveis às dos nossos pares internacionais, sendo muitos de nós convidados para exercer a sua atividade noutros países.

RFD – Com base nas particularidades da sociedade portuguesa, quais são os principais desafios que se colocam a quem está numa fase inicial da carreira?
LANuma fase inicial da carreira, o fisioterapeuta tem dificuldade em ser integrado numa determinada área, específica ou preferencial, usando outra palavra. Por norma, os recém-licenciados iniciam-se com um trabalho mais generalista e sem grande autonomia. São contratados e sem vínculo à entidade, o que, por norma, proporciona uma certa instabilidade profissional e também económica. Também poderão não ter um horário completo, o que obriga a trabalharem em diferentes locais perfazendo por vezes um número de horas absurdo, excessivo. Mas, apesar destas contrariedades, e pensando de um modo positivo, esta passagem por uma experiência generalista, contactando com todo o tipo de patologias, com todo o tipo de utentes e com diferentes condições de trabalho, poderá redundar num processo de aprendizagem e de consolidação dos conhecimentos teórico-práticos adquiridos no curso de graduação. E este processo não é de forma alguma desprezível no quadro do reconhecimento da sua verdadeira área preferencial de atuação, potenciando quer a forma de direcionar a sua formação para a mesma quer os “caminhos” escolhidos para a alcançar.

RFD – É possível ou gostaria de destacar uma ou várias pessoas que avalie como importantes ou até determinantes na sua escolha profissional?
LANão tanto na minha escolha, mas sim no início e durante o meu percurso como fisioterapeuta no e do Desporto. Destaco os treinadores de Ginástica Artística masculina, Manuel Pastor e na classe feminina José Ferreirinha, assim como o treinador de voleibol António Ferreira pela confiança demonstrada e valorização do meu trabalho. E, também destaco o colega e “expert” Armando Jorge, bem como o Dr. Nelson Puga, que me lançaram nos eventos mais importantes e me transmitiram muitos dos seus conhecimentos.

RFD – Ao longo dos anos, que experiências foram mais marcantes e quais as que releva tanto no sentido positivo como negativo?
LASem dúvida que a experiência mais marcante foi a participação nos Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000. Colocaria em primeiríssimo lugar. Outras experiências que destaco também foram a participação nas Summer Universíades em Itália (1997) e na Coreia do Sul (2003), a exemplo do Campeonato Mundial de Ginástica Artística (edições de 2003 e de 2007) e do Festival Olímpico da Juventude Europeia (FOJE) (em 2009). Durante o meu acompanhamento “longitudinal” aos ginastas como fisioterapeuta, posso destacar como uma experiência negativa a ocorrência de uma lesão do ligamento cruzado anterior na véspera de um (único) apuramento para os Jogos Olímpicos (no caso concreto, Atenas 2004). Embora este acontecimento faça parte do risco inerente à atividade desportiva, esta lesão comprometeu a presença nas olimpíadas. Mas, e em continuidade dessa mesma lesão, outra experiência com o lado marcantemente positivo foi toda a recuperação e persistência do atleta até novo apuramento (após dois ciclos Olímpicos) e participação merecida e recompensadora nos Jogos Olímpicos de Londres 2012.

RFD – Do ponto de vista familiar, pagou algum “preço” pelo facto de se ter dedicado especificamente à fisioterapia?
LASim, acaba por ser inevitável pelo facto de estar muito tempo ausente, sobretudo em alguns dos momentos mais importantes da vida das minhas três filhas. Contudo, existe uma parte altamente compensadora, além da nossa realização profissional e pessoal, que é o orgulho que as filhas sentem e demonstram no trabalho da mãe.

RFD – Numa perspectiva mais intimista, que outros interesses e que outras áreas lhe despertam mais a atenção?
LAAlém da área profissional, como fisioterapeuta e como docente, interesso-me por artes manuais, como a olaria e mosaico. Espero um dia aprofundar os meus conhecimentos e prática nestas duas áreas…

BI DE LUÍSA AMARAL

Fisioterapeuta desde 1982 a 2020, exercendo nos últimos 24 anos no Centro de Medicina Desportiva;

Acompanhamento de seleções e equipas desportivas de 1996 a 2010;

Mestre em Desporto para Crianças e Jovens (FADEUP’ 2007);

Doutorada em Ciências do Desporto (FADEUP’ 2012);

Título de Especialista em Fisioterapia (2021);

Docente no Curso de Fisioterapia na Escola Superior de Saúde Fernando Pessoa (desde 2004).